A retificação de nome e gênero nos documentos civis tem representado uma das principais conquistas para pessoas trans no Brasil. Desde 2018, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) garante que esse processo seja feito diretamente em cartório, sem necessidade de cirurgia, laudo médico ou decisão judicial. O reconhecimento legal da identidade de pessoas travestis e transexuais é uma importante medida de respeito, cidadania e dignidade. Para além dos trâmites legais, essa mudança impacta diretamente a autoestima, a segurança e a forma como essas pessoas são tratadas na sociedade.
No próximo dia 29 de junho, será realizada a Trielétrica 2025, programação em um trio elétrico que será comandado pela apresentadora Katiúzia Rios com muito entretenimento, reconhecimento e visibilidade à comunidade LGBTQUIAPN+ de Fortaleza, durante a Parada pela Diversidade Sexual, na Av. Beira-Mar. A seguir, conheça as histórias de quem viveu na prática o processo de conquistar o direito à retificação do nome nos documentos.
Maria Vanessa: “Foi o divisor de águas da minha vida”
Natural de Pacatuba (CE), Maria Vanessa, conhecida nas redes como “Titia Vanessa”, compartilha sua vivência com mais de 67 mil seguidores. Influenciadora digital e ciclista, ela descreve a retificação de seus documentos como um marco pessoal. “Foi um MOMENTO LIBERTADOR. Não, não achem que cirurgias são tão importantes assim. A leveza de ver os documentos retificados desde a certidão até a identidade com as minhas VERDADEIRAS CARACTERÍSTICAS é algo de outro mundo”, afirmou.
Vanessa lembra com emoção do apoio familiar. “Meu irmão, Venicius, juntamente com meus pais, me presentearam com esse momento. Sim, eu chorei! Minha mãe também! Pois foi ali o divisor de águas… minha família se reporta a mim desde o princípio por ELA e MARIA VANESSA. Isso me empoderou, me trouxe um autovalor; foi tipo ‘agora eu sou livre’”, compartilha.
Sobre o processo, Vanessa enfatiza que atualmente o caminho é menos burocrático do que há anos atrás, quando era necessário “advogado, redesignação sexual e audiência diante de um juiz”. Hoje, segundo ela, “você só precisa buscar seu cartório de registro, pegar a listagem de documentos e ir em busca deles. Em sete dias, a certidão já está pronta”. Ela lembra que gastou cerca de R$ 600 na época e aconselha: “Organize com calma, cautela, e tenha uma rede de apoio pra te fortalecer nesta fase”.
Para ela, a retificação não é apenas administrativa, mas um ato de resistência: “Ter o gênero confundido em público, o nome ‘morto’ exposto, é algo que traz muito abalo e gatilhos. A segurança que a retificação nos traz é a certeza de que somos mulheres e homens trans dignos e reconhecidos”. E completa: “Todos nós somos dignas e dignos de respeito, amor, acolhimento e validação”.
Jazz da Costa: “Me ver como sou e ser respeitada por isso”
A estudante Jazz da Costa, de 23 anos, também passou pela retificação de seus documentos em Fortaleza e descreve o momento como inesquecível. “Foi uma mistura de sentimentos. Ao mesmo tempo que eu estava feliz, com a sensação de que tinha conseguido, eu também queria chorar — mas de felicidade”, disse. “Por mais que seja um papel, acaba moldando os pensamentos e modos de como nos vemos. As pessoas passaram a me ver como eu me vejo: mulher”.
Jazz afirma que o processo foi rápido e sem dificuldades: “Quase tudo se resolvia muito perto e, sempre que havia alguma dúvida, tinham pessoas dispostas a ajudar”. Segundo ela, é fundamental buscar informação e contar com apoio, pois o reconhecimento legal muda a forma como a sociedade trata uma pessoa trans. “Ser chamada e identificada através desse simples papel muda muito qualquer situação que poderia trazer constrangimento. A própria conquista de ter conseguido a retificação eleva você em muitos aspectos, principalmente a autoestima”, declarou.
Para outras pessoas trans que pensam em iniciar o processo, Jazz aconselha: “Não tenham medo. É algo transformador. O que vem depois é muito maior do que o esforço para conseguir”.
O que diz a lei e como fazer a retificação
Desde a decisão do STF em 2018, qualquer pessoa trans maior de 18 anos pode solicitar a alteração de nome e gênero diretamente no cartório de Registro Civil. O cartório onde a pessoa nasceu deve receber o pedido, mas o processo pode ser iniciado em qualquer unidade. É necessário apresentar uma lista de documentos, incluindo certidões negativas, documento de identidade e CPF. Após a retificação, o cidadão pode atualizar os demais documentos como RG, título de eleitor e passaporte.
Os valores variam conforme o estado, mas é possível solicitar isenção dos custos mediante declaração de hipossuficiência. Caso o cartório se recuse a realizar o procedimento ou exija requisitos indevidos, como cirurgia ou laudos médicos, é possível denunciar às corregedorias dos Tribunais de Justiça, Defensorias Públicas ou diretamente ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que disponibiliza contatos e canais de denúncia em seu site oficial.
Para menores de 18 anos, o processo exige autorização judicial e o acompanhamento de pais ou responsáveis legais.
Trielétrica 2025
Fonte: gcmais.com.br